E
a nossa glória?
Não devemos desperdiçar nosso sofrimento. De acordo com a
Bíblia, um dos propósitos e aplicações do sofrimento diz respeito à glória de
Deus. Não há nada que revele, comunique e transmita a glória de Deus tanto
quanto o sofrimento. Obviamente é uma glória perfeita e, assim, não pode ser
aumentada. Mas pode, como o salmista repete tantas vezes, ser “engrandecida”.
Se Deus for tratado como Deus durante o sofrimento, então o sofrimento revela e
apresenta Deus em toda sua grandeza.
Mas Paulo também afirma que o sofrimento prepara uma glória
para nós. “Pois nossa tribulação leve e
passageira produz para nós uma glória incomparável...” (2 Co 4.17). Então
perguntamos: “Como o sofrimento nos beneficia?”. Antes de responder, temos de
considerar o que a Bíblia ensina sobre o que se chama hoje de autoajuda. Existe
um princípio no cerne da vida cristã que é revelado por duas declarações
famosas do Senhor Jesus Cristo:
Bem-aventurados os que têm fome e sede de
justiça, porque eles serão fartos;
Mateus 5:6
Quem achar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a sua vida,
por amor de mim, achá-la-á.
Mateus 10.39
Na primeira declaração, Jesus está ensinando: “Feliz é aquele
que busca não a felicidade, mas a justiça”. A felicidade é subproduto do desejo
de ter algo mais do que felicidade: ter um relacionamento de retidão com Deus e
o próximo. Se Deus é o bem inegociável em nossa vida, a felicidade é um bônus.
Se, no entanto, tudo que almejarmos for a felicidade pessoal, acabamos ficando
sem nenhum dos dois. Encontramos o mesmo
princípio na segunda declaração de Jesus. Se estivermos dispostos a perder a vida por
amor a ele — dispostos a abrir mão da segurança pessoal, do conforto e da
satisfação para obedecer e seguir a Jesus —, acabaremos nos encontrando.
Descobriremos quem somos de verdade em Cristo e
encontraremos a paz.
No entanto, se tentarmos alcançar conforto e satisfação pessoal
sem que nossa vida em Deus esteja centralizada em Cristo, acabaremos com uma
terrível falta de autoconhecimento e vazio interior.
Isso não poderia ser mais oposto à nossa cultura ocidental de
eloquente individualismo. E se aplica diretamente ao modo de os cristãos
lidarem com o sofrimento. Como já vimos, devemos confiar em Deus porque Ele
merece, é digno disso, e não porque seremos beneficiados. Se amamos e
obedecemos a Deus por quem Ele é, e não por interesse próprio, vamos nos tornar
pessoas fortes, nobres e sábias. Se desistirmos de buscar a nós mesmos e buscarmos
a Deus, encontraremos tanto um quanto o outro. “Mira o céu, e a terra virá como
bônus. Mira [somente] a terra, e não receberá nenhum dos dois.”
Como esse princípio de Jesus funciona? Nós nos tornamos
sábios quando vemos e abraçamos Deus como Ele é, porque isso nos põe em contato
com a realidade. Da mesma forma que acender as luzes numa sala escura permite que
você caminhe sem tropeçar nas coisas, enxergar a justiça, a grandeza, a
soberania, a sabedoria e o amor de Deus impede que você cambaleie pela vida com
amargura, orgulho, ansiedade e desânimo. Se buscarmos não nosso próprio
benefício, mas a glória de Deus, alcançaremos,
de modo paradoxal, o desenvolvimento de nossa glória, ou seja, de nosso caráter,
humildade, esperança, amor, alegria e paz.
O sofrimento, como veremos, pode levar a crescimento
pessoal, instrução e transformação, contudo, jamais poderemos acreditar que ele
seja o principal instrumento para nos tornarmos pessoas melhores. Esse ponto de
vista leva ao masoquismo, à apreciação da dor, já que só nos achamos virtuosos
quando estamos sofrendo. Mesmo sem essa
perspectiva, o sofrimento nos predispõe à autoabsorção. Se ele for encarado como algo voltado principalmente
para nós e nosso crescimento, vai nos sufocar de verdade. Em vez disso,
precisamos olhar para o sofrimento — sejam quais forem as causas imediatas —
principalmente como um meio de conhecermos mais a Deus, como uma porta para
servirmos, nos assemelharmos a ele e chegarmos, como nunca antes, mais perto
dEle.
Somente quando fizermos da glória de Deus a coisa mais
importante do sofrimento, alcançaremos nossa própria glória. E as tristezas e
dificuldades também podem levar a isso. Somos alertados a não desperdiçar nosso
sofrimento, mas sim a crescer por meio deles em graça e glória.
(KELLER – Timothy, Caminhando Com Deus em Meio a Dor e ao
Sofrimento, pg 205-207)
Editado por:
Laércio Otone
Salto – SP, 24/06/17